OMS sugere ‘estudos robustos’ sobre ivermectina na luta contra a Covid-19
A cientista chefe da OMS disse que ‘infelizmente, não há estudos de muita qualidade’
O comando da Organização Mundial de Saúde (OMS) demonstrou certo ceticismo sobre a chance de que a ivermectina possa ser eficiente na luta contra a Covid-19, mas não descartou a possibilidade e pediu estudos consistentes sobre o medicamento e outros potenciais candidatos. Durante entrevista coletiva virtual nesta sexta-feira (18), a cientista chefe da OMS, Sumya Swaminathan, disse que “infelizmente, não há estudos de muita qualidade conduzidos com ivermectina, são todos pobres, de baixa qualidade”. Ela pediu “mais evidências” nessa frente.
Sumya Swaminathan tratou da questão na coletiva, ao ser questionada por uma jornalista sobre o caso do México. A repórter disse que o país tem há meses queda nos casos da Covid-19 e que lá se utiliza ivermectina – empregado em princípio para combater parasitas, como piolhos – contra o vírus. A cientista chefe da OMS afirmou que vários países, depois de um pico da doença, conseguiram reduzir seus números na pandemia, fazendo “uma série de intervenções públicas, sem ivermectina necessariamente”.
Segundo ela, “é preciso ter a mente aberta”, mas a pesquisadora também notou que os estudos de observação “dão pistas”, especialmente em contextos em que várias coisas estão ocorrendo ao mesmo tempo. Swaminathan ressaltou a importância de que potenciais medicamentos passem por estudos robustos e, só nesse caso, possam ser apontados como responsáveis por melhorar o quadro.
Líder técnica da resposta à pandemia de Covid-19 da OMS, Maria Van Kerkhove afirmou que a melhora no quadro do México deve ser fruto de uma combinação de fatores, seja de saúde pública, como a vacinação dos mais idosos e de profissionais de saúde, seja por medidas individuais.
Sobre a ivermectina, ela também notou que a recomendação da OMS é de que se use o medicamento em ensaios clínicos.
Kerkhove disse que pesquisadores pelo mundo têm se debruçado sobre a ivermectina e que seus estudos são analisados regularmente.
Quando essas informações forem atualizadas, a OMS pretende olhar de novo para os dados disponíveis e decidirá se qualquer recomendação pode ser alterada, notou. “Esse é o processo para todas as terapias avaliadas”, disse, citando a consolidação de evidências de pequenas e grandes pesquisas, a meta-análise e uma “revisão robusta e transparente” dos dados disponíveis.
Em sua resposta, Swaminathan lembrou que, anteriormente, houve relações similares feitas entre um potencial risco menor de contrair Covid-19 e a vacina BCG ou a hidroxicloriquina, “sem se considerar outros fatores”.
Em julho de 2020, a OMS interrompeu uma investigação com a hidroxicloroquina, um dos braços de seu estudo Solidariedade, ao avaliar os resultados parciais e concluir que o medicamento “produzia pouca ou nenhuma redução na mortalidade de pacientes hospitalizados por Covid-19”, segundo o site da entidade.
Em março, uma revisão feita por especialistas a partir de seis ensaios clínicos com 6 mil pacientes descartou a hidroxicloroquina como potencialmente responsável por evitar infecções pelo vírus. Em abril de 2020, a OMS já afirmava não haver evidência de que a vacina BCG pudesse ajudar a proteger contra a Covid-19.
Uso de Tofacitinibe no combate à covid
Nesta quarta-feira (16), tornou-se pública a informação de que um estudo do Hospital Israelita Albert Einstein apontou que esse medicamento para artrite reumatoide da farmacêutica Pfizer reduziu em 37% o risco de morte ou falência respiratória em pacientes internados com quadro moderado e pneumonia associada à Covid-19.
O Tofacitinibe, vendido pelo nome comercial Xeljanz, agiu na tempestade de citocinas, reação exacerbada do sistema imunológico que pode afetar o funcionamento de órgãos vitais e até levar à morte. Ele tem a capacidade de modular o sistema imunológico, evitando o processo.
Biomédica e pesquisadora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Mellanie Fontes-Dutra diz que ainda é necessário ter mais dados e estudos. “Se a gente for olhar o número de pacientes, 289, ele é baixo. É um estudo preliminar, que precisa de mais dados. Ainda não é algo que poderíamos pensar em trazer para o país. Teria de esperar o amadurecimento dos dados.”
Mesmo assim, ela diz que é uma notícia positiva para a ciência.
“O dado e a redução são interessantes. E é um estudo feito no Brasil. É importante celebrar a parceria do Einstein com a Pfizer.”
Outro ponto destacado pela pesquisadora é que a população não deve interpretar o resultado como uma certeza de que o medicamento é um tratamento para a doença. “Tem de tomar muito cuidado para que não faça com que os negacionistas tratem esse remédio como fazem com a ivermectina. Não é para extrapolar para casos leves e muito menos para prevenção da doença.”
Isso já tinha sido alertado por Otávio Berwanger, diretor da Academic Research Organization (ARO) do Einstein, em entrevista ao Estadão nesta quarta-feira (16). “A medicação foi utilizada em pacientes que não tinham contra-indicações, na dose correta, com acompanhamento diário dos pesquisadores e em ambiente controlado e no hospital. Neste momento, está saindo o resultado da pesquisa.”
A questão também foi abordada pela diretora Médica da Pfizer Brasil, Márjori Dulcine.
“É muito importante ressaltar que o medicamento não foi aprovado ou autorizado para uso por nenhuma agência regulatória no mundo para o tratamento na Covid-19, uma vez que o estudo publicado é o primeiro randomizado, multicêntrico a avaliar o seu impacto no tratamento da doença. Sua eventual utilização no arsenal anticovid dependerá da extensa avaliação desses dados por parte dos órgãos reguladores e autoridades de saúde.”
Médico sanitarista e professor da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo, Gonzalo Vecina diz que a medicação foi adotada na fase 2 da doença, em um momento em que o paciente não estava em quadro leve nem grave.
Ele avalia que, caso seja adotada no futuro, será necessário avaliar se o Brasil teria condições financeiras de incorporar a medicação. “Tem de entrar em uma fase com um número grande de pacientes. Então, vai ter o impacto de pacientes que podem ser potencialmente elegíveis e, embora a Pfizer não tenha falado em preço, o fato é que cada caixa custa R$ 5 mil. Ainda é muito caro e é fora da realidade de qualquer país.”
Ainda de acordo com Vecina, o fato de o medicamento já ter sido incorporado ao SUS para artrite reumatoide não mudaria a situação, pois uma nova análise teria de ser feita pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec).
Anvisa
Até maio deste ano, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) já aprovou o uso emergencial de três opções de tratamento medicamentoso para pacientes com a Covid-19.
Em março, foi aprovado o antiviral Rendesivir, do laboratório Gilead. No mês seguinte, foi a vez da associação entre anticorpos monoclonais casirivimabe e imdevimabe, das farmacêuticas Regeneron e Roche.
No mês passado, mais um coquetel de anticorpos monoclonais foi liberado pela agência: a combinação de banlanivimabe e etesevimabe, da Eli Lilly do Brasil.
Fonte: Agência Estado/Dom Total
Você precisa fazer login para comentar.