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O poder do diálogo inter-religioso em tempos de intolerância religiosa

O poder do diálogo inter-religioso em tempos de intolerância religiosa

Embora a fonte da tradição de fé seja divina, a maneira de viver a tradição é histórica, condicionada ao tempo e ao espaço, ao contexto em que se vive

Renato Carvalho de Oliveira*

Não haverá coexistência humana sem uma ética mundial por parte das nações; não haverá paz entre as nações sem uma paz entre as religiões; não haverá paz entre as religiões sem o diálogo entre as religiões. (Hans Küng)

Nunca se falou tanto em diálogo entre as religiões quanto nos séculos XX e XXI. E ainda se fala pouco diante dos impactos de conflitos religiosos, em nossa vida quotidiana. A consciência de que o pluralismo religioso compõe a realidade de fé das pessoas mobiliza uma resposta sábia, que frutifica, atrelada ao espírito democrático, e que visa a contribuir com o combate à violência de caráter religioso e com o direito à liberdade de culto. Quanto mais aumenta a intolerância religiosa, mais se sente a necessidade de buscar o diálogo inter-religioso, como estilo de vida lúcido, crítico, ético, espiritual, existencial, aberto para se professar a fé, em um contexto plural.

Uma das variantes que move a intolerância religiosa, em pessoas de fé, é a presença do fundamentalismo religioso, o qual, para o teólogo Leonardo Boff, no livro Fundamentalismo: a globalização e o futuro da humanidade: ?Não é uma doutrina. Mas uma forma de interpretar e viver a doutrina. É assumir a letra das doutrinas e normas sem cuidar de seu espírito e de sua inserção no processo sempre cambiante da história, que obriga a contínuas interpretações e atualizações, exatamente para manter sua verdade essencial. Fundamentalismo representa a atitude daquele que confere caráter absoluto ao seu ponto de vista.?

Se fundamentalistas consideram única a própria maneira de interpretar e viver a doutrina religiosa, então, o fundamentalismo religioso é uma oposição a outras formas de dizer e viver a verdade. O fundamentalista considera a própria apreensão da verdade como a única possível, e visa preservá-la, ao se opor às demais apreensões. Não existe outra forma de se chegar à verdade senão a dele. Essa visão é o que, para Roberlei Panasiewicz, no livro Pluralismo religioso contemporâneo: diálogo religioso na teologia de Claude Geffré, ?[…] gera intolerância e desprezo do outro e das outras maneiras de compreender a verdade, provocando, inclusive, práticas violentas.?

O estudo Fundamentalismo religioso contemporâneo, de Pace e Stefani, apresenta quatro princípios do fundamentalismo: 1) negação de erros na Bíblia (inerrância); 2) incompetência da razão humana para interpretar e atualizar a mensagem divina, em vista de preservar a originalidade da verdade religiosa (astoricidade); 3) dedução de uma sociedade ideal a partir do livro sagrado, para governar a sociedade civil no propósito de implantar a comunidade perfeita (superioridade); 4) coesão social a ser buscada por todos os crentes movidos por um sistema de crenças que replica a sociedade-modelo do livro sagrado (primado do mito da fundação da identidade de um grupo).

O teólogo católico Claude Geffré, em Crer e interpretar, explica que há dois fundamentalismos no Cristianismo: o escriturístico, centrado na sacralização da letra da Bíblia ou Sagrada Escritura, é comum a uma ala católica e a outra ala protestante; e o integralismo doutrinal, que sacraliza a tradição de dogmas da Igreja Católica e se recusa a aceitar as inovações do Concílio Vaticano II (1962-1965), que abriram a Igreja ao diálogo com o mundo.

Leonardo Boff, em Fundamentalismo, informa que há o fundamentalismo doutrinário, o qual defende que a Igreja Católica é a única Igreja de Cristo, sendo o catolicismo a única religião verdadeira, à qual as outras religiões devem se converter. Sustenta a centralização do poder sacramental somente nas mãos do patriarcado (o clero: bispos, padres e Papas), a exclusão das mulheres do sacerdócio, por serem mulheres, rebaixamento dos leigos ao autoritarismo clerical, por não terem poder de administrar sacramentos. E o fundamentalismo ético-moral, que dá uma orientação existencial fechada ?” moralista, puritana ?”, em vista de controlar melhor o comportamento dos crentes. É contrário, por exemplo, ao uso de preservativo, considera a masturbação e a homossexualidade pecaminosos.

O fundamentalismo religioso é diversificado, nas religiões. E isso é o que autoriza os pesquisadores a considerarem-no um fenômeno no plural, isto é, como fundamentalismos. Mas, de acordo com Roberlei, todos têm em comum: a) a dificuldade com a interpretação e atualização de textos sagrados, por não considerarem a mente humana capaz de interpretar a lei divina vista como superior a lei humana; e b) a superioridade da religião em relação à política, por a primeira conter um fundamento sagrado.

Existem muitos debates sobre diálogo inter-religioso. Na teologia das religiões, o debate se debruça nos paradigmas de diálogo inter-religioso ?” o exclusivista, o inclusivista e o pluralista ?” e nas conexões, relações, divergências e convergências entre eles.

O paradigma exclusivista, o eclesiocentrismo ?” a Igreja é o único lugar da salvação ?”, defende que fora da Igreja não há salvaçãoExtra ecclesiam nulla salus. É, segundo Roberlei Panasiewicz, em Diálogo e revelação: rumo ao encontro inter-religioso, uma expressão que surge no século III d.C., na Igreja Oriental, com Orígenes, quando este dizia aos judeus que o Antigo Testamento era insuficiente para a salvação. E, na Igreja Ocidental, com Cipriano de Cartago, no contexto de conflitos, rupturas com a comunidade cristã, o que o leva a dizer que: Fora da igreja não há salvação.

Panasiewicz reitera que essa fórmula foi interpretada por vinte séculos de cristianismo, em sentido exclusivista, a saber: se somente os cristãos tiveram acesso a Deus Revelado, na história, só os cristãos poderiam ser salvos por Ele. Perpetuou-se por quinze séculos da Cristandade (séc. IV-XIX), período iniciado em 380, ano em que o cristianismo tornava-se a religião oficial do Império Romano, pelo Edito de Tessalônica, do Imperador Teodósio I. E seguia, nos séculos posteriores, com a expansão da Igreja no mundo pelo poder do Estado.

Em As artes de governar: do regimen medieval ao conceito de governo, Michel Senellart afirma que, no primeiro milênio da Cristandade, ?O rei é um braço armado que a Igreja quer dócil.? Nesse eclesiocentrismo político, nascem dois métodos de evangelização compulsória das culturas, que, para os historiadores Dale T. Irvin e Scott W. Sunquist, são: na Inglaterra e Nortúmbria, a cristianização gradual, pela qual o Papa Gregório Magno (540-604) ?orientava os missionários a substituírem os deuses pagãos por relíquias de santos cristãos e adaptar os templos em igrejas?; e, em outras regiões, a cristianização imediata, que previa ?atacar as crenças e práticas tradicionais do povo que queriam converter.?

O contato direto da Igreja com povos e líderes de tribos guerreiras que migraram para a região do Império Romano e foram batizadas, a exemplo dos francos, forjou uma visão de cristianismo guerreiro, em que Cristo é o rei-guerreiro, triunfalista, aquele que converte e vence pela força da espada. Para essa mentalidade religiosa, o batismo é compulsório. Reis guerreiros da Cristandade, de povos tribais, assumiram o trono sob a tutela de Papas, como Carlos Magno (rei de 768 a 814). Ele empreendia conquistas militares, impondo a conversão compulsória, sob pena de morte, aos povos saxões, executando 4 mil pessoas, para servir de exemplo e dobrar a resistência.

Esses dois métodos caracterizaram o modelo expansionista e colonialista de evangelização, na Cristandade moderna (séc. XVI-XIX). Período de expansão da Igreja aliada ao expansionismo comercial, de conquistadores, invasores, oriundos de nações europeias, em outros continentes, como África e América.

Em âmbito inter-religioso, destacam-se dois efeitos do projeto de poder da colonização europeia, patriarcal, centrado na expansão pela conquista e invasão com base na força: o racismo religioso e a intolerância religiosa. Desde os séculos XVI e XVII, os africanos escravizados foram reprimidos, punidos, proibidos e mortos por cultuarem seu Sagrado. Seus cultos eram considerados primitivos demais para serem civilizados e humanos. Os escravizados foram considerados como animais sem razão, seres primitivos, sem a cultura e a noção eurocêntrica de humanidade do colonizador.

Fica claro, nos estudos decoloniais, a exemplo de Pierre Verger e Reginaldo Prandi, a violência religiosa do colonizador europeu sobre as outras religiões consideradas pagãs, herança do paradigma de evangelização da cristandade, o expansionista e colonialista. Buscara expandir a religião cristã pela violência do poder, do saber e do ser de culturas não-cristãs. Essa violência cultural e religiosa faz aparecer um modelo racista e intolerante de sincretismo religioso, que foi imposto na Nigéria e chegou até os séculos XX e XXI. Esse modelo começa a operar na África em um período histórico, conforme o historiador João Ferreira Dias, de implantação do projeto de cristianização dos povos yorubanos pelos missionários anglicanos e católicos, nos séculos XVIII e XIX.

Esse modo sincrético representou a religião e as divindades desconhecidas, por meio de um capital simbólico negativo, mecanismo próprio da cristandade colonial. Sikírù Sàlámì King, em Exu e a ordem do universo, informa que, quando a Bíblia foi traduzida ?” por Samuel Crowther, yorubano que foi escravizado e convertido ao anglicanismo ?” para a língua yorubana, traduziu-se Diabo como o orixá Èsù, que, etimologicamente, significa esfera, por remeter a movimento, transformação.

Prandi, no artigo Exu: de mensageiro a diabo, defende que, ao verem a representação de Exu com um falo, que simboliza fertilidade, os missionários europeus o identificaram com o Diabo, já que este era associado a outros deuses gregos, como Príapo, com genitália exposta e ligada à reprodução. A visão negativa da cristandade sobre o sexo atrelado ao pecado e ao diabo influenciou os missionários a chamarem Exu de ?Príapo africano?. Diabolizaram o Orixá, mas nem se deram ao trabalho de entendê-lo, na teologia e no culto local.

O sincretismo racista e intolerante é violento, porque opera com um critério teológico de negação e anulação do ser e do saber do outro diferente do europeu. Uma teologia que explica a origem do mal pela diabolização e demonização da alteridade religiosa, do outro que não se manipula, e que se entende pelos critérios ocidentais, não é uma boa teologia, porque não é ética: ela oculta a alteridade religiosa ?” o rosto do diferente imanipulável ?” de outros povos, para afirmar a própria identidade. É, sim, uma teologia racista, colonialista, preguiçosa, intolerante, com pretensão de tornar únicas as próprias verdades (fundamentalismo), para sustentar um projeto de poder religioso.

A intolerância religiosa e o racismo religioso estrutural se fortaleceram, no meio pentecostal, a partir dos livros de bispos neopentecostais do envangelicalismo: Walter McAlister ?” Mãe de Santo: história e testemunho de D. Georgina Aragão dos Santos. A verdade sobre a Umbanda e o Candomblé (1983); R.R. Soares ?” Espiritismo, a magia do engano (1984); e Edir Macedo ?” Orixás, cabocos e guias: deuses ou demônios? (1988).

Esses subprodutos teológicos, extremamente racistas, fundamentalistas, intolerantes, primeiro, operam com um novo sincretismo negativo ?” de negação da identidade religiosa dos outros pela demonização e diabolização (herança dos missionários católicos e anglicanos) ?”  e capitalista, já que se ganha muito dinheiro e se constroem templos, instrumentalizando a simbologia do mal para controlar adeptos e converter pessoas às igrejas eletrônicas (isso é novo no sincretismo). Em segundo lugar, são responsáveis por difundirem duas teologias pentecostais e neopentecostais contra as religiões afro-brasileiras e o espiritismo, no século XX e XXI.

É Wagner Gonçalves da Silva, em Intolerância religiosa: impacto do Neopentecostalismo no campo religioso afro-brasileiro, quem delas nos dá notícia: a) a teologia do combate espiritual, que prega que as forças do bem, cristãs, precisam combater as forças do mal, que não são cristãs; e b) a teologia da prosperidade, para a qual, ser pobre é estar sob a influência do diabo e de demônios, e o dízimo, em grande quantidade de dinheiro, precisa ser dado a Deus para que as pessoas sejam prósperas e se libertem da ação maléfica.

Nesses escritos, a desonestidade intelectual e as falácias teológicas reinam, por equipararem o diabo e os demônios a entidades angelicais decaídas: os Orixás do Candomblé, as entidades da Umbanda e os espíritos do Espiritismo. E isso não é posição oficial da Igreja Católica nem das Igrejas protestantes históricas.

Essas teologias pentecostais são desdobramentos da mentalidade exclusivista, a qual perdurou até o Concílio Vaticano II (1962-1965), como posição oficial da Igreja Católica, que estava centrada numa imagem de igreja triunfalista. O Vaticano II representou uma abertura e uma conversão da Igreja para reconhecer as outras religiões como verdadeiras. O diálogo é o fundamento dessa abertura para o pluralismo religioso. É com esse giro do catolicismo para o diálogo que Panasiewicz identificou o surgimento do paradigma inclusivistacristocêntrico, por defender que Cristo está nas outras religiões. Mas, não deixa de ser problemático. Na década de 70, percebendo os limites do inclusivismo ?” como uma tentativa de neocolonialismo cristão em relação a outras tradições ?”, teólogos das religiões propuseram o paradigma pluralista, que é teocêntrico, já que Deus é a linguagem comum a todas as religiões: Ele salva as pessoas nas próprias religiões.

A discussão em torno dos paradigmas exclusivistainclusivista e pluralista mostra os problemas, os limites e as possibilidades de cada um para o Cristianismo. Há teólogos que tentam uma articulação mais aberta entre o paradigma conciliar, o inclusivismo, e o paradigma pós-conciliar, o pluralismo, para potencializar o diálogo inter-religioso, em chave cristã.

Com isso, não quisemos fazer um julgamento ressentido sobre a relação histórica das igrejas cristãs com outras religiões. Mas colocar às claras, em tom de autocrítica, que Cristianismo, à luz da mensagem bíblica interpretada com lucidez, não é Cristandade, a qual, com seus méritos e deméritos civilizacionais, compõe um longo período da história de uma instituição religiosa. Cristianismo, no entendimento da atual teologia cristã, não é igreja triunfalista sobre outras religiões e igrejas.

Papas, reis e súditos cristianizados identificaram cristandade com cristianismo, em nome de um projeto de poder. Mas, a ética da fé e da espiritualidade cristãs não permite aos cristãos de hoje fazerem essa identificação e viverem em função dela. A Cristandade, no primeiro e segundo milênios, e a ética bíblica interpretada criticamente comprovam que o Cristianismo não é o mesmo em todos os lugares e tempos, e não tem o mesmo significado para todas as pessoas. Essa diferença nos é cara para estabelecer relações de diálogo inter-religioso.

Quando se fala em diálogo inter-religioso, no Brasil, há, ao menos, duas tendências acadêmicas entre cristãos. A de teólogos que só falam das religiões consideradas semíticas, reveladas ?” ou religiões vistas por eles como monoteístas ?”, e, com isso, omitem as religiões afro-brasileiras de suas pesquisas: será reprodução de racismo religioso-intelectual e intolerância religiosa, ou apenas falta de competência? E a de teólogos que priorizam as religiões de matrizes africanas, por tomarem consciência do racismo estrutural que tenta invisibilizá-las e ocultar a potência delas para contribuírem com a prática e a teologia do diálogo inter-religioso.

O diálogo é também uma forma de exercer o poder da autoridade do caráter das pessoas pelo exemplo de vida. Qualquer pessoa pode fazê-lo desde esse lugar ético, existencial e místico. O diálogo tem uma dimensão de reconhecimento do direito de existir com dignidade. E, por isso, o diálogo inter-religioso não é um pacifismo descomprometido social e politicamente; mas confere sentido político e ético às práticas religiosas, em que não se combate intolerância e racismo com reprodução de violência neocolonial, mas com autoridade moral, qualidade da experiência de fé lúcida, crítica e bem fundada e não-fundamentalista, e competência epistemológica, política, jurídica, espiritual, teológica. Dialogar é a identidade religiosa que coloca-se a trabalho no encontro com outras identidades religiosas. Não há espaço para atitudes mentais e comportamentais acomodadas, narcisistas, proselitistas, racistas, bairristas, absolutas. Quem não gosta de se relacionar com pessoas se incapacitou para o diálogo.

O poder do diálogo tem a dimensão de propiciar às pessoas de fé a coexistência respeitosa com outras religiões. O diálogo inter-religioso pressupõe o espírito do encontro, segundo Andrés Torres Queiruga, no livro O diálogo das religiões. No encontro, todas as religiões aprendem. E aprendem melhor sobre si e as outras. Há reconhecimento das verdades de fé já experimentadas, do quão preciosa é a própria tradição, mas o quão ela pode ser estreita, se não revisitada, interpretada e atualizada na experiência dos fiéis. A consciência das próprias deficiências é um fator que evita o fundamentalismo da fé. Inclusive, a autocrítica nos faz perceber que, às vezes, não reconhecemos as riquezas divinas que a estreiteza da própria tradição impede de ver em outras tradições.

Desse modo, não existem tradições religiosas absolutas, inquestionáveis. Embora a fonte da tradição de fé seja divina, a maneira de viver a tradição é histórica, condicionada ao tempo e ao espaço, ao contexto em que se vive. É humana e está sujeita a equívocos e limites. Existem tradições temporais e, portanto, atualizáveis, revisitadas, contextualizadas. A tradição é a transmissão de um espírito de vida que dá origem a formas plurais de ser e estar no mundo. É assimilação de um espírito que se torna uma identidade que não pode ser negada, mas assumida. Por isso, dialogar requer reconhecimento da própria identidade.

A sabedoria de matriz africana diz que tudo que o Divino criou tem axé, força vital, divina. E considera o axé uma força que se expande e preenche o universo. Se o axé é expansão da vida e não exclusivisa ninguém, há muito de positivo, de valores e riqueza, a se reconhecer e aprender de outras tradições e outras identidades religiosas. Eis aqui um critério teológico potente das religiões afro-brasileiras, para enriquecer as experiências e as teologias do diálogo inter-religioso.

Essa visão faz pensar que o poder do diálogo inter-religioso frente à intolerância religiosa consiste em reconhecer que, nas religiões, há respostas diversas do Divino para a busca espiritual dos humanos, e formas distintas de os humanos se relacionarem com o Divino. O que caracteriza um diálogo inter-religioso como teológico é a atitude ética de reconhecimento: há expressões diversas do Sagrado, em cada religião, e, por isso, formas plurais de professar a fé religiosa. Ambas autênticas. Resta dizer que cada religião tem abordagens teológicas diferentes acerca do diálogo entre religiões. Se dialogar é também uma experiência da fé aberta ao pluralismo, então cada pessoa vive o diálogo, a partir da grandeza ética e do patrimônio espiritual da tradição religiosa a que pertence. Diálogo inter-religioso é preservar e potencializar a identidade da própria fé, no encontro com outras tradições.

As religiões, na pessoa de seus líderes e adeptos, em vez de cultivarem inimizades entre si, podem ser aliadas, pois o inimigo comum não são elas em si mesmas, e sim as práticas inimigas de injustiças sociais: o colonialismo e o expansionismo; o racismo estrutural; o abuso de poder, sexual, de consciência e espiritual; o fundamentalismo religioso e a intolerância religiosa; o controle social do capitalismo; o mau-caratismo; a corrupção; o empobrecimento e a fome; as guerras; as agressões ao Planeta. Tudo isso diz respeito às religiões, seja porque a sabedoria ancestral delas leva os crentes a uma responsabilidade pelo bem-estar das pessoas e da Terra, seja porque elas foram atingidas por essas práticas que dependem de estruturas e pessoas se retroalimentando.

Pensemos, com a provocação: a minha fé me expande para uma forma de vida em diálogo ou me fecha em um estilo de vida como bolha religiosa, carregada da alterofobia Ocidental, isto é, de pavor do diferente, em nome de uma idealização da pureza de caráter religioso, que nega as interfaces, as convergências do sagrado, o sincretismo prático, o enriquecimento mútuo entre as religiões?

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