Francisco abriu o Vaticano para mulheres. O cargo de cardeal será o próximo?
A nova constituição apostólica de Francisco, “Praedicate Evangelium” (“Pregar o Evangelho”), publicada no mês passado, observou que os chefes dos dicastérios e outros escritórios que administram a Igreja não precisam ser ordenados. Isso destacou o objetivo declarado de Francisco de dar “mais espaço” às mulheres na Igreja.
A maioria dos dicastérios importantes são, de fato, chefiados por cardeais. Mas se algum católico pode chefiar um escritório da Cúria, a pergunta é: o título vem com o cargo? Mais importante, o título é necessário para fazer o trabalho?
Se o principal dever de um cardeal é ser um conselheiro do papa, e não há necessidade de ordenação, pode fazer sentido reiniciar a tradição dos cardeais leigos e incluir as mulheres na mistura.
Desde o século 16, os cardeais vêm principalmente das fileiras de padres e bispos, mas nem sempre foi assim.
Alguns membros da realeza espanhola e italiana foram criados cardeais na Igreja medieval. Mais recentemente, o Papa Pio IX nomeou cardeal o advogado da Cúria Teodolfo Mertel, dois meses antes de ordená-lo diácono em 1858.
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Mertel não era exatamente um cardeal leigo (recebeu a tonsura clerical, um rito pouco antes da ordenação, aos 30 e poucos anos), mas permaneceu um cardeal diácono pelo resto de sua vida.
Como auditor do tesouro papal, supervisionava boa parte do dinheiro do Vaticano.
Há até evidências históricas de diáconos femininos fazendo o mesmo. Uma inscrição do século VI lembra a diácona Ana, que, com seu irmão, parece ter servido como tesoureira de Roma.
Sob o Código de Direito Canônico de 1917, no entanto, qualquer pessoa nomeada cardeal era obrigada a ser pelo menos ordenada sacerdote. A versão de 1983 do código determina que, além de serem escolhidos entre homens que sejam pelo menos sacerdotes, os novos cardeais devem aceitar a ordenação como bispos. A nomeação de um homem ou mulher leigo exigiria uma mudança, ou pelo menos uma dispensa da lei.
No entanto, no final da década de 1960, o Papa Paulo VI considerou tornar o filósofo francês Jacques Maritain um cardeal leigo, uma ideia que o próprio Maritain rejeitou. Há um boato de que Madre Teresa recusou o Papa João Paulo II quando ele a pediu para se tornar cardeal.
Portanto, cardeais leigos e femininos não estão além do reino das possibilidades. A questão é, faria alguma diferença?
Certamente seria interessante. Cardeais leigos ou diáconos seriam admitidos no Colégio dos Cardeais, que desde 1179 elegeu o próximo papa. É altamente improvável que um cardeal leigo ou mulher seja eleito bispo de Roma.
Mas Francisco já nomeou um leigo, o ex-jornalista Paolo Ruffini, para chefiar o Dicastério para a Comunicação, e a ênfase do papa na missão de evangelização da Igreja sinaliza que sua escolha de pessoal (homem ou mulher, casado ou solteiro, ordenado ou não) depende apenas na capacidade e vontade de fazer o trabalho dentro desse contexto.
A mensagem do “Praedicate Evangelium” é que se tornar um cardeal é secundário e relativo apenas a como ganhar o título avançaria ou não na tarefa em mãos. Isso inclui expandir a gestão e o ministério para leigos. Isso também inclui dizer ao mundo que as mulheres são seres humanos igualmente talentosos e capazes.
Então, chegou a hora de cardeais mulheres?
Talvez sim, talvez não. Mas é uma nova Igreja.
Traduzido por Ramón Lara.
Escrito por Phyllis Zagano é pesquisadora associada residente e professora adjunta de religião na Hofstra University, em Hempstead, Nova York. Seu livro mais recente é Mulheres: Ícones de Cristo.