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O ‘mundanismo espiritual’, o mal da igreja para o Papa Francisco

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O maior mal na Igreja é o ‘mundanismo espiritual’, diz o Papa Francisco

O mundanismo espiritual gera o clericalismo que leva a posições rígidas e ideológicas, onde a ideologia toma o lugar do Evangelho
O Papa Francisco aparece na RAI3, uma emissora estatal italiana, no domingo, 6 de fevereiro de 2022.
O Papa Francisco aparece na RAI3, uma emissora estatal italiana, no domingo, 6 de fevereiro de 2022. ((Crédito: captura de tela.))
Em uma nova entrevista a uma rede de transmissão italiana, o Papa Francisco alertou contra males espirituais, como fofocas e mundanismo espiritual, dizendo que este último causa o maior dano à Igreja porque alimenta o clericalismo.

Questionado sobre sua visão para o futuro da Igreja Católica e o maior problema com que ela enfrenta hoje, o papa disse que imagina a Igreja futura como foi descrita pelo Papa Paulo VI em sua encíclica de 1975, Evangelii Nuntiandi, como “uma Igreja em peregrinação.”

Quanto ao maior problema da Igreja, Francisco disse que “o maior mal da Igreja é o mundanismo espiritual. É a pior coisa que pode acontecer à Igreja, pior do que os papas libertinos”, muitos dos quais eram culpados de várias formas de corrupção.

O mundanismo espiritual, disse o papa, “faz crescer o clericalismo”, e o clericalismo, disse, é “uma perversão da Igreja” que leva a diferentes formas de “rigidez”.

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“O clericalismo gera rigidez, e sob toda rigidez há algo pútrido. O mundanismo espiritual gera o clericalismo que leva a posições rígidas e ideológicas, onde a ideologia toma o lugar do Evangelho”, apontou.

O Papa Francisco falou durante uma entrevista gravada que foi exibida durante o programa Che Tempo Che Fa da emissora estatal italiana RaiTre, exibido na noite de domingo.

Na entrevista, o papa abordou vários tópicos sobre os quais se manifestou abertamente, incluindo os migrantes, o meio ambiente, os perigos da fofoca e a proximidade com aqueles que sofrem.

A nível pessoal, admitiu ao apresentador Fabio Fazio que o seu primeiro trabalho de sonho de infância foi ser açougueiro, e que a sua música favorita são os clássicos e o tango, que também dançou quando jovem.

Brincando sobre ser portenho, que significa “pessoa da cidade portuária” geralmente se referindo a alguém de Buenos Aires, disse que “um portenho que não dança tango não é um portenho”.

Questionado sobre os 12 migrantes encontrados recentemente congelados até a morte perto da fronteira Turquia-Grécia, Francisco disse que isso é “um sinal da cultura da indiferença”, que é uma doença da qual “estamos padecendo”.

Esta indiferença, disse, começa com o “problema da categorização” e o fato de, para muitos, “as crianças, os migrantes, os pobres, os que não têm o que comer, não contam, são as categorias inferiores, eles não estão em primeiro lugar.”

“Na imaginação universal o que conta é a guerra. Com um ano sem fabricar armas, o mundo poderia ser alimentado e educado livremente, mas isso está em segundo lugar”, disse, e instou os países europeus a fazer uma avaliação honesta e um compromisso de quantos migrantes podem receber.

“A Itália e outros países precisam de pessoas”, disse o papa, acrescentando que “um migrante integrado ajuda esse país”.

Sobre o meio ambiente, o papa lamentou que a humanidade muitas vezes se veja como “onipotente diante da terra”.

“Devemos cuidar da Mãe Terra”, apontou, lembrando que o pescador de San Benedetto del Tronto uma vez o procurou dizendo que havia limpado várias toneladas de plástico daquela parte do mar.

“Jogar plástico no mar é criminoso, mata”, disse o Papa Francisco.

O Santo Padre exortou os fiéis a estarem perto daqueles que sofrem, e novamente expressou tristeza pelo sofrimento das crianças, que é algo que disse que pediu a Deus, mas ainda não consegue entender. Sem resposta para uma pergunta tão preocupante, Francisco falou que a única coisa a fazer neste ponto “é sofrer com eles”.

Sobre o tema da fofoca, que muitas vezes condenou e exortou os fiéis a se absterem, o papa disse que é aqui que começam as divisões e até as guerras, enraizadas em uma “agressão destrutiva” tão característica da sociedade moderna.

“A agressão destrutiva é um problema social”, disse, observando que a agressão social tem sido amplamente estudada por psicólogos.

O Papa Francisco se absteve de fazer mais comentários sobre o assunto, por não ser um especialista, mas apontou para o crescente número de suicídios de jovens e o problema do bullying nas escolas, seja online ou pessoalmente, dizendo que “a agressão deve ser educada”.

“Existe uma agressão positiva e destrutiva”, disse. “Começa com uma coisinha, com a língua, com a fofoca. Fofocar em famílias, entre pessoas, destrói a identidade. Não à fofoca, se você tem algo contra o outro, ou você come ou vai contar na cara deles, é preciso coragem.”

Perguntado se há algo pelo qual uma pessoa não pode ser perdoada, o papa disse que não, observando que Deus deu à humanidade o livre arbítrio e que cada pessoa é capaz de fazer o bem ou o mal.

“Somos livres e mestres para tomar nossas próprias decisões, mesmo as erradas”, apontou, mas enfatizou que “a capacidade de ser perdoado é um direito humano, todos temos o direito de ser perdoados se pedirmos perdão”.

O Papa Francisco na entrevista também falou sobre o que significa rezar, suas amizades, e disse que não assiste TV.

Sobre seus amigos, o papa disse que tem “poucos amigos, mas verdadeiros. Eu gosto de estar com eles. Eu preciso de amigos. Por isso não morei no palácio pontifício”.

Francisco também disse que seus antecessores “eram santos”, mas brincou que “não sou tão santo assim, não poderia ter feito isso… gosto de viver com as pessoas, é mais fácil”.

Traduzido por Ramón Lara.

Escrito por Elise Ann Allen, Twitter: @eliseannallen

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