Viver Evangelizando

Com a TV Bolsonaro ninguém mexe

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A EBC é empresa gestora de radiodifusão pública e determina princípios e objetivos que não estão sendo observados atualmente

Com a TV Bolsonaro ninguém mexe, diante do vexaminoso episódio de bajulação política perpetrado por um comentarista e narrador de uma partida da Seleção Brasileira contra o Peru, na semana passada, transmitida pela TV Brasil, a senhora Tereza Cruvinel, a primeira presidente da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), da qual faz parte a TV citada, escreveu um texto num portal, em que afirma que, durante seu mandato (2007 a 2011), “a mídia comercial vigiou obsessivamente a TV Brasil em busca de sinais de “governismo” ou “chapabranquismo”. O Ministério Público também fiscalizou severamente a EBC, especialmente em momentos eleitorais, “para evitar partidarismo na cobertura”.

Ao contrário do que ela própria imagina, Cruvinel está há anos luz de ter sido uma boa primeira presidente da EBC, seja por sua truculência ao gerir a empresa e no tratamento com funcionários, seja por seu delírio de se considerar a “fundadora” única da empresa como faz crer. Como se a EBC não tivesse sido uma construção coletiva que envolveu muita gente – inclusive ela – com participação ativa de um núcleo da área audiovisual que depois participou do ministério da Cultura de Lula – Gilberto Gil.

Feito esse reparo, é fato o que diz Cruvinel quando afirma que “inacreditavelmente, tanto a mídia quanto o Ministério Público silenciam diante da escandalosa deformação do sistema público de radiodifusão gerido pela EBC levada a cabo pelo governo, que transforma os canais públicos, especialmente a TV Brasil, em veículos oficialistas, a serviço da propaganda governamental, do proselistismo político-ideológico e da promoção pessoal do presidente da República, Jair Bolsonaro”.

Na transmissão, como ela lembra, tudo foi inadequado a uma emissora pública. Mas ela deixou de ser pública quando o desgoverno Temer foi acabando com a EBC, nomeando seus prepostos que a transformaram no pastiche que é hoje. Muito embora o começo do fim da EBC tenha começado com Temer, é bom lembrar que a estaca no coração da comunicação pública não foi dada pelo vampiro, mas por esse celerado que ocupa o Planalto espero que não por muito tempo.

Diziam equivocadamente que a TV Brasil era a “TV do Lula”. Agora é a TV do Bolsonaro, como lembra a própria Cruvinel, que assegura que, durante sua gestão, “nem Lula nem qualquer um de seus ministros e auxiliares, tentaram alguma vez usar os canais públicos para fazer proselitismo ou autopromoção”. Não tenho como garantir se isso é a pura verdade, mas, nessa época, ocupava cargo de segundo escalão na emissora que era gerente de produção no Rio de Janeiro , responsável direto por colocar no ar – do jeito que dava pois muita coisa era improvisada – quase uma dúzia de programas. E, na minha área, nunca houve qualquer ingerência dessa espécie. Hoje, Bolsonaro chega até a determinar a transmissão de um ato religioso pela emissora e não é segredo que ocorre censura contra jornalistas, para garantir só aquilo que seja do interesse do desgoverno.

A tal letra fria da lei (no caso, Lei 11 652/2008) trata a EBC como empresa gestora de radiodifusão pública e determina princípios e objetivos que não estão sendo observados atualmente. O principal é garantir a autonomia em relação ao governo para fixar a programação que, diga-se de passagem, está cada vez pior. A ilegalidade está sacramentada apesar dos protestos inócuos de funcionários e entidades de classe.

No passado, como aponta a senhora Cruvinel, a vigilância era por conta de Lula “que acolheu a demanda da sociedade, via Fórum da TV Pública, e patrocinou a criação da EBC”. Assim, a mídia nativa que não queria uma TV pública forte, passou a esculachar a iniciativa desde o começo. Hoje, diante de tanta iniquidade, não dá mesmo pra entender tanto despautério diante do qual o Ministério Público se cala e consente. Como se calam e consentem tantas entidades, grupos e pessoas país afora diante do desmonte geral da nação promovido por uma quadrilha que todos os dias abrem mais e mais portas do inferno que a EBC não vai mostrar. Antes o contrário. Vai refrigerar o mormaço quente que sai desse inferno e vendê-lo como um picolé de utopias perdidas.

Fonte: Ricardo Soares é diretor de TV, roteirista, escritor e jornalista. Publicou nove livros. Foi gerente de produção da TV Brasil entre 2007 e 2009 e diretor de conteúdo e programação da EBC entre 2013 e 2014/ DomTotal

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